"...o círculo da união conjugal comum, que era muito amplo em sua origem, estreita-se pouco a pouco até que, finalmente, compreende apenas o casal isolado que hoje predomina. (...)
E, de fato, que encontramos como forma mais antiga e primitiva da família, cuja existência possamos comprovar irrefutavelmente pela história e que ainda hoje podemos estudar em certos lugares? É o casamento grupal, forma em que grupos inteiros de homens e grupos inteiros de mulheres se possuem mutuamente, deixando bem pouca margem para ciúmes.
(...) primeira etapa da família (...) só os ascendentes e os descendentes, os pais e os filhos, estão reciprocamente excluídos dos direitos e deveres do casamento (...) nesse estágio, o vínculo de irmão e irmã pressupõe por si a relação sexual entre ambos. (...)
Se o primeiro progresso na organização da família consistiu em excluir os pais e os filhos das relações sexuais entre si, o segundo foi a exclusão dos irmãos. (...)
Em todas as formas de família por grupos, não se pode saber com certeza quem é o pai de uma criança, mas sabe-se quem é a mãe (...) a descendência por linha materna é a única decisiva, sendo a única certa. Uma vez proibidas as relações sexuais entre todos os irmãos e irmãs, inclusive os colaterais mais distantes por linha materna, o grupo de que falamos se transforma numa gens, isto é, constitui-se como que um círculo fechado de parentes consanguíneos por linha feminina que não se podem casar entre si. (...)
À medida que, porém, desenvolvia-se a gens e se tornavam mais numerosas as classes de irmãos e irmãs, entre os quais agora era impossível o casamento, a união conjugal por pares, baseada num certo costume, começou a se consolidar (...) Com o crescente emaranhado das proibições de casamento, os casamentos por grupos se tornaram cada vez mais impossíveis e acabaram sendo substituídos pela família pré-monogâmica. Nesse estágio, um homem vive com uma mulher, mas de forma tal que a poligamia e a infidelidade ocasional permanecem um direito dos homens, embora a poligamia seja raramente observada, também por causas econômicas, ao passo que, na maioria dos casos, exige-se das mulheres a mais rigorosa fidelidade enquanto durar a vida em comum, sendo o adultério destas castigado de maneira cruel."
ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. trad. Ciro Mioranza. ed. Escala, p. 42-57.