"Os anarquistas, se é que se pode encontrar algo de comum entre eles, têm em mira apenas o indivíduo, sem representantes, sem delegações, produtor, naturalmente em sociedade. Positivamente, eles preconizam uma nova sociedade e indicam alguns meios para isto.
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Existem vários anarquismos. A tentativa é detectá-los historicamente para compreendê-los um pouco antes que nos obriguem a esquecê-los.
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Os anarquistas sempre estiveram de acordo em relação ao fim último de seus propósitos, divergindo apenas quanto à tática mais convincente para consegui-lo. Os partidários de Tolstoi, próximos ao que se pode chamar de anarquismo cristão, não admitiam a violência em nenhuma circunstância. O inglês William Godwin esperava determinar mudanças mediante discussões. Proudhon e seus partidários propugnavam a mudança social através da proliferação das organizações cooperativas. Kropotkin aceitava a violência, mas a contragosto e somente porque a considerava inevitável na revolução e esta por sua vez inevitável na etapa do progresso humano. Bakunin em vários momentos teve dúvidas, mas combateu em barricadas e exaltou o caráter sanguinário da insurreição camponesa. Contrito, chegou a dizer que as revoluções cruéis são necessárias, única e exclusivamente por causa da estupidez humana;
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Todos os anarquistas concordam que o homem possui, por natureza, todos os atributos necessários para viver em liberdade e concórdia social. Não acreditam que o homem seja bom por natureza, mas estão convencidos de que o seja por natureza social.
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O ódio visceral de todos os anarquistas é contra este leviatã da sociedade moderna, este organismo imenso e todo-poderoso, a síntese da autoridade e da centralização, a espada de Dâmocles que, pendida sobre a cabeça de cada cidadão, foi paulatinamente conquistando o poder político, econômico e social: o Estado. Todos o fulminam com invectivas e adjetivos. Consideram-no seu inimigo. Bakunin enlaça o conceito de Estado com o de Deus e os proclama principais adversários da liberdade humana. Proudhon não cansa de repetir que o governo do homem pelo homem é a servidão (...)"
COSTA, Caio Túlio. O que é o Anarquismo. ed. Brasiliense. pp. 11-17.